III. O nome Spinoza
Spinoza é considerado por muitos estudiosos da Filosofia como um filósofo difícil. De fato, a começar pelo nome, pois a diversidade de registros do nome de Spinoza e seus derivados têm provocado divergências desde o século XIX, cuja grafia oscilava entre as formas Spinoza [1] e Spinosa [2]. A fim de evitar ambiguidades, faz-se necessário uma explicação para nossa utilização da grafia Spinoza, com seus derivados spinozista, spinozismo e spinozano, sem nenhuma pretensão de fundamentação histórica [3] ou filológica [4], pois há muito que estas estão sendo utilizadas com resultados adversos e muito menos qualquer coerência editorial [5].
Segundo Luís Machado de Abreu, nos textos em língua portuguesa a grafia Spinoza foi aceita sem questionamentos até princípios do século XX [6]. Em 1903, o estudioso holandês Willem Meyer, apoiando-se em cartas de Spinoza, questionou essa grafia por considerar mais correta a forma Despinoza, por ser a mais usualmente empregada pelo autor. Dunin-Borkowski, algum tempo depois, defendia praticamente os mesmos pressupostos e soluções. (ABREU, 1993, p. 315).
Carl Gebhardt, antes de aceitar a nova grafia em trabalhos eruditos, submeteu a questão a uma nova apreciação, considerando como critério a grafia correta do nome próprio, a partir da forma registrada pelo próprio autor, o que o levou a examinar onze assinaturas de Spinoza, então conhecidas. Essas assinaturas abrangem o período de 1662 a 1675, e apresentam-se registradas com as seguintes variações: (1) Junho de 1662 - Benedictus Spiñoza, (2) e (3) 3 de agosto de 1663 - B. d'Spinoza e B. de Spinoza, (4) 13 de março de 1665 - e B. de Spinoza, (5) 3 de junho de 1665 - B. de Spinoza, (6) 20 de novembro de 1665 - B. de Spinoza, (7) 21 de outubro de 1671 - B. despinoza, (8) 9 de novembro de 1671 - B. despinoza, (9) 14 de dezembro de 1673 - Benedictus despinoza, (10) julho de 1675 - B. de Spinoza, (11) 18 de novembro de 1675 - B despinoza [7]. A estas acrescente-se a forma B. de. Spinoza, registrada na carta de Spinoza a Luís Meyer, datada de 26 de julho de 1663, cuja publicação, em 1977, deve-se a A. K. Offenberg [8]. Novas assinaturas do filósofo foram encontradas em documentos notariais, assim, em 21 de maio de 1665 e 17 de novembro de 1671 [9], assina Bento despinoza, e em 1º de fevereiro de 1673 [10] utiliza a forma B. despinoza.
Quanto ao primeiro nome, por ser favorável à naturalidade portuguesa dos pais de Spinoza, Carl Gebhardt era de opinião de que a forma original do nome era Bento, pois descendia de marranos portugueses. O termo equivalente em espanhol é Benito, mas não há registro de que tenha sido utilizada. Entretanto foi Benedictus, a grafia na forma latinizada que acabou se impondo, dividindo a preferência nas assinaturas que chegaram até nós com a abreviatura B. Donde, podermos afirmar que após sua excomunhão ou Herem, ocorrida em 27 de julho de 1656, Spinoza evitou assinar o seu nome completo em hebraico, Baruch, cujo significado é bendito. (ABREU, 1993, p. 316).
Com relação ao sobrenome, Abreu afirma que o registro que se impõe pelo uso pelo próprio filósofo é Spinoza, acrescentando que as iniciais que se encontram no selo do filósofo, B D S (com o S invertido), parecem corroborar esta conclusão. Quanto ao fato da preposição, inúmeras vezes, aparecer justaposta ao sobrenome, Abreu explica-o pela prática corrente no séc. XVII de unir, na escrita à mão, a preposição à palavra regida por ela. Esses casos são frequentes nos escritos de Spinoza, como em: Udequa, ame, apropositione, por de qua, a me, a propositione, respectivamente. (ABREU, 1993, p. 316).
Donde, Abreu concluir que a forma mais recomendável seria Benedictus de Spinoza. Entretanto, ele ressalta que o registro Bento de Spinoza, não deve ser considerado menos correto, uma vez que se encontra bem firmado em documentos de arquivo, e não há dúvidas acerca da identidade do comerciante Bento de Spinoza com o filósofo Benedictus de Spinoza [11]. Acrescentando o argumento de que o único livro publicado em vida "Renati Des Cartes Principiorum Philosophiæ Pars I et II More Geometrico demonstratæ", cuja edição em 1963 Spinoza acompanhou muito de perto, aparece registrada a forma per Benedictum de Spinoza Amstelodamensematina. Em 1664, na tradução holandesa do mesmo, também se pode ler: "door Benedictum de Spinoza Amsterdammer" isso nos dá a garantia do próprio filósofo de que a opção pela forma latina do nome e da forma Spinoza para o sobrenome seria a mais aconselhável. (ABREU, 1993, p. 316).
De nossa parte, no que tange ao nome e sobrenome do filósofo, concordamos inteiramente com a argumentação de Abreu, motivo este pelo qual a expusemos quase em sua totalidade. Mas no que se refere aos derivados, discordamos da sua escolha dos termos espinosismo, espinosista, espinosano, pois a mesma foi baseada nas regras ortográficas vigentes em Portugal. Assim, conforme citado acima, optamos pelo uso das formas derivadas spinozista, spinozismo, spinozano, pois estas são as que estão mais acordes com as regras gramaticais do português falado e escrito no Brasil, a partir da opção pela forma Spinoza, pois os termos derivados de nomes próprios estrangeiros com grafias estranhas ao português devem preservar as características da grafia original, de acordo com praticamente todas as convenções de simplificação ortográfica do português tentadas no Brasil e em Portugal. (HOUAISS, 2001, verbete Derivado).
NOTAS:
Segundo Luís Machado de Abreu, nos textos em língua portuguesa a grafia Spinoza foi aceita sem questionamentos até princípios do século XX [6]. Em 1903, o estudioso holandês Willem Meyer, apoiando-se em cartas de Spinoza, questionou essa grafia por considerar mais correta a forma Despinoza, por ser a mais usualmente empregada pelo autor. Dunin-Borkowski, algum tempo depois, defendia praticamente os mesmos pressupostos e soluções. (ABREU, 1993, p. 315).
Carl Gebhardt, antes de aceitar a nova grafia em trabalhos eruditos, submeteu a questão a uma nova apreciação, considerando como critério a grafia correta do nome próprio, a partir da forma registrada pelo próprio autor, o que o levou a examinar onze assinaturas de Spinoza, então conhecidas. Essas assinaturas abrangem o período de 1662 a 1675, e apresentam-se registradas com as seguintes variações: (1) Junho de 1662 - Benedictus Spiñoza, (2) e (3) 3 de agosto de 1663 - B. d'Spinoza e B. de Spinoza, (4) 13 de março de 1665 - e B. de Spinoza, (5) 3 de junho de 1665 - B. de Spinoza, (6) 20 de novembro de 1665 - B. de Spinoza, (7) 21 de outubro de 1671 - B. despinoza, (8) 9 de novembro de 1671 - B. despinoza, (9) 14 de dezembro de 1673 - Benedictus despinoza, (10) julho de 1675 - B. de Spinoza, (11) 18 de novembro de 1675 - B despinoza [7]. A estas acrescente-se a forma B. de. Spinoza, registrada na carta de Spinoza a Luís Meyer, datada de 26 de julho de 1663, cuja publicação, em 1977, deve-se a A. K. Offenberg [8]. Novas assinaturas do filósofo foram encontradas em documentos notariais, assim, em 21 de maio de 1665 e 17 de novembro de 1671 [9], assina Bento despinoza, e em 1º de fevereiro de 1673 [10] utiliza a forma B. despinoza.
Quanto ao primeiro nome, por ser favorável à naturalidade portuguesa dos pais de Spinoza, Carl Gebhardt era de opinião de que a forma original do nome era Bento, pois descendia de marranos portugueses. O termo equivalente em espanhol é Benito, mas não há registro de que tenha sido utilizada. Entretanto foi Benedictus, a grafia na forma latinizada que acabou se impondo, dividindo a preferência nas assinaturas que chegaram até nós com a abreviatura B. Donde, podermos afirmar que após sua excomunhão ou Herem, ocorrida em 27 de julho de 1656, Spinoza evitou assinar o seu nome completo em hebraico, Baruch, cujo significado é bendito. (ABREU, 1993, p. 316).
Com relação ao sobrenome, Abreu afirma que o registro que se impõe pelo uso pelo próprio filósofo é Spinoza, acrescentando que as iniciais que se encontram no selo do filósofo, B D S (com o S invertido), parecem corroborar esta conclusão. Quanto ao fato da preposição, inúmeras vezes, aparecer justaposta ao sobrenome, Abreu explica-o pela prática corrente no séc. XVII de unir, na escrita à mão, a preposição à palavra regida por ela. Esses casos são frequentes nos escritos de Spinoza, como em: Udequa, ame, apropositione, por de qua, a me, a propositione, respectivamente. (ABREU, 1993, p. 316).
Donde, Abreu concluir que a forma mais recomendável seria Benedictus de Spinoza. Entretanto, ele ressalta que o registro Bento de Spinoza, não deve ser considerado menos correto, uma vez que se encontra bem firmado em documentos de arquivo, e não há dúvidas acerca da identidade do comerciante Bento de Spinoza com o filósofo Benedictus de Spinoza [11]. Acrescentando o argumento de que o único livro publicado em vida "Renati Des Cartes Principiorum Philosophiæ Pars I et II More Geometrico demonstratæ", cuja edição em 1963 Spinoza acompanhou muito de perto, aparece registrada a forma per Benedictum de Spinoza Amstelodamensematina. Em 1664, na tradução holandesa do mesmo, também se pode ler: "door Benedictum de Spinoza Amsterdammer" isso nos dá a garantia do próprio filósofo de que a opção pela forma latina do nome e da forma Spinoza para o sobrenome seria a mais aconselhável. (ABREU, 1993, p. 316).
De nossa parte, no que tange ao nome e sobrenome do filósofo, concordamos inteiramente com a argumentação de Abreu, motivo este pelo qual a expusemos quase em sua totalidade. Mas no que se refere aos derivados, discordamos da sua escolha dos termos espinosismo, espinosista, espinosano, pois a mesma foi baseada nas regras ortográficas vigentes em Portugal. Assim, conforme citado acima, optamos pelo uso das formas derivadas spinozista, spinozismo, spinozano, pois estas são as que estão mais acordes com as regras gramaticais do português falado e escrito no Brasil, a partir da opção pela forma Spinoza, pois os termos derivados de nomes próprios estrangeiros com grafias estranhas ao português devem preservar as características da grafia original, de acordo com praticamente todas as convenções de simplificação ortográfica do português tentadas no Brasil e em Portugal. (HOUAISS, 2001, verbete Derivado).
NOTAS:
[2] Conforme por exemplo, para citar somente um dentre muitos, ANGELIS (DE). Article "Spinosa" [sic]. In: MICHAUD, Louis-Gabriel. Biographié Universelle Ancienne et Moderne, Histoire, par Ordre Alphabétique, de la vie Publique et Privée de tous les Hommes Grande... Tome Quarantième, [Spaan-Tapper], 2. ed. Leiden: IDC, [1983]. Reprod. de l'éd. de Paris: Madame C. Desplaces, Librairie de F. A. Brockaus, p. 64-69, [18.?].
[3] Como por exemplo justificar a grafia SPINOZA ou SPINOSA, afirmando que foi assim que escreveu todos os tradutores e comentadores franceses desde o século XIX.
[4] Como por exemplo, Gabriel Albiac, que justifica a grafia ESPINOSA com a alegação de que está mais acorde com a evolução da língua. (Apud ABREU, Nota 1, p. 319). De nossa parte, acrescentamos a justificativa filológica de Diogo Pires Aurélio, em sua tradução portuguesa do TTP: Utilizamos aqui a grafia ESPINOSA e, por conseguinte, espinosismo, em vez daquela que, mais por efeito de traduções, se tende a generalizar entre nós. Há de fato, algumas razões em favor da versão Spinoza, a começar pela maneira como o autor assinou por diversas vezes, mas a origem castelhana do apelido, realçada por filólogos como Leite de Vasconcelos e C. Michaëlis de Vasconcelos, aconselha que se prefira a transcrição com S (cf. Carvalho, 1930, ed. 1978, pp. 367-368). Quanto ao nome Baruch, que na versão latina aparece como Benedictus, julgamos ser de manter a versão hebraica, tal como faz, no artigo citado, o mesmo Joaquim de Carvalho, muito embora, anos mais tarde, na sua tradução da I parte da Ética, tenha cedido à tentação de o aportuguesar, escrevendo Bento de Espinosa. (grifo nosso).
[5] Como por exemplo, A. Sérgio em carta a Joaquim de Carvalho, na qual roga-lhe fixar editorialmente o nome de Spinoza. (Apud ABREU, Nota 2, p. 319).
[6] A esta afirmativa de Abreu, podemos acrescentar a afirmativa de Francisco Xavier Peña Echeverria, que afirma ser esta forma a mais usual entre os autores espanhóis. (PEÑA ECHEVERRÍA, 1989, Nota 1, p. 9).
[7] Cf. GEBHARDT, 1921, p. 273. Também citado em ABREU, 1993, p. 315-316.
[8] HESSING, Siegfried, Speculum Spinozanum 1677-1977, p. 426-435.
[9] Cf. A. M. VAZ DIAS, W. G. VAN DER TAK, Spinoza merchant & autodidact. Separata de Studia Rosenthaliana, 2 (1982), p. 161-162. (Apud ABREU, Nota 7, 1993, p. 319).
[10] Cf. M. PETRY, Guido VAN SUCHTELEN, Spinoza and the military: a newly-discovered document, Studia Spinozana, 1 (1985), p. 359-369. (Apud ABREU, Nota 8, 1993, p. 319).
[11] Cf. A. M. VAZ DIAS, W. G. VAN DER TAK, Spinoza merchant & autodidact. Separata de Studia Rosenthaliana, 2 (1982), p. 165. (Apud ABREU, Nota 9, 1993, p. 319).
COMO CITAR ESTE TEXTO EM TRABALHOS ACADÊMICOS:
Para citar e/ou incluir este texto em Referências Bibliográficas de trabalhos acadêmicos (TCCs, monografias, dissertações, teses, etc.) deve-se adotar o modelo abaixo, conforme as normas da ABNT prescrevem (não esquecer de atualizar a data para a de seu acesso):
FRAGOSO, Emanuel Angelo da Rocha. O nome de Spinoza. Disponível em: <http://www.benedictusdespinoza. pro.br/o-nome-spinoza.html>. Acesso em: 06 mai. 2020. [Coloque a data em acessou].
[3] Como por exemplo justificar a grafia SPINOZA ou SPINOSA, afirmando que foi assim que escreveu todos os tradutores e comentadores franceses desde o século XIX.
[4] Como por exemplo, Gabriel Albiac, que justifica a grafia ESPINOSA com a alegação de que está mais acorde com a evolução da língua. (Apud ABREU, Nota 1, p. 319). De nossa parte, acrescentamos a justificativa filológica de Diogo Pires Aurélio, em sua tradução portuguesa do TTP: Utilizamos aqui a grafia ESPINOSA e, por conseguinte, espinosismo, em vez daquela que, mais por efeito de traduções, se tende a generalizar entre nós. Há de fato, algumas razões em favor da versão Spinoza, a começar pela maneira como o autor assinou por diversas vezes, mas a origem castelhana do apelido, realçada por filólogos como Leite de Vasconcelos e C. Michaëlis de Vasconcelos, aconselha que se prefira a transcrição com S (cf. Carvalho, 1930, ed. 1978, pp. 367-368). Quanto ao nome Baruch, que na versão latina aparece como Benedictus, julgamos ser de manter a versão hebraica, tal como faz, no artigo citado, o mesmo Joaquim de Carvalho, muito embora, anos mais tarde, na sua tradução da I parte da Ética, tenha cedido à tentação de o aportuguesar, escrevendo Bento de Espinosa. (grifo nosso).
[5] Como por exemplo, A. Sérgio em carta a Joaquim de Carvalho, na qual roga-lhe fixar editorialmente o nome de Spinoza. (Apud ABREU, Nota 2, p. 319).
[6] A esta afirmativa de Abreu, podemos acrescentar a afirmativa de Francisco Xavier Peña Echeverria, que afirma ser esta forma a mais usual entre os autores espanhóis. (PEÑA ECHEVERRÍA, 1989, Nota 1, p. 9).
[7] Cf. GEBHARDT, 1921, p. 273. Também citado em ABREU, 1993, p. 315-316.
[8] HESSING, Siegfried, Speculum Spinozanum 1677-1977, p. 426-435.
[9] Cf. A. M. VAZ DIAS, W. G. VAN DER TAK, Spinoza merchant & autodidact. Separata de Studia Rosenthaliana, 2 (1982), p. 161-162. (Apud ABREU, Nota 7, 1993, p. 319).
[10] Cf. M. PETRY, Guido VAN SUCHTELEN, Spinoza and the military: a newly-discovered document, Studia Spinozana, 1 (1985), p. 359-369. (Apud ABREU, Nota 8, 1993, p. 319).
[11] Cf. A. M. VAZ DIAS, W. G. VAN DER TAK, Spinoza merchant & autodidact. Separata de Studia Rosenthaliana, 2 (1982), p. 165. (Apud ABREU, Nota 9, 1993, p. 319).
COMO CITAR ESTE TEXTO EM TRABALHOS ACADÊMICOS:
Para citar e/ou incluir este texto em Referências Bibliográficas de trabalhos acadêmicos (TCCs, monografias, dissertações, teses, etc.) deve-se adotar o modelo abaixo, conforme as normas da ABNT prescrevem (não esquecer de atualizar a data para a de seu acesso):
FRAGOSO, Emanuel Angelo da Rocha. O nome de Spinoza. Disponível em: <http://www.benedictusdespinoza. pro.br/o-nome-spinoza.html>. Acesso em: 06 mai. 2020. [Coloque a data em acessou].